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Maria Mello de Borba

Dona Nina registra o desenvolvimento da cidade em seus versos, que viraram até livro.

Apesar de ter estudado por apenas dois anos durante a infância, Maria Mello de Borba, a Dona Nina, nunca deixou de se dedicar à leitura e à escrita. Esse talento a permitiu narrar e descrever os acontecimentos que se sucederam ao longo de seus 80 anos de vida, passados na cidade piçarrense.

Nascida em 12 de novembro de 1942, Dona Nina é filha de Ernestina Rodrigues de Mello e Jonas Mariano de Mello. Ela frequentou a Escola Adolfo Cabral, ainda com estrutura de madeira no bairro Santo Antônio, aos 7 e 8 anos de idade, sob supervisão das professoras Rita Cabral e Nadir Vieira, mas foi retirada dos estudos depois de uma mudança que foi acarretada pela separação dos pais.

Os versos criados por Dona Nina se tornaram populares entre a família e os amigos, e eram lidos nas rádios da região, por meio de ligações realizadas por ela. “Mesmo não tendo muito estudo, sempre gostei de ler tudo o que aparecia na minha frente e aos poucos comecei a desenvolver a escrita de versinhos rimados. Em festas de aniversário, em eventos de família, sempre escrevo versos e gosto de rimá-los”, declara com orgulho.

Dona Nina passou a ocupar a cadeira número 13 da Academia de Letras do Brasil Seccional Balneário Piçarras em 14 de dezembro de 2015 – o aniversário de 52 anos do município. No mesmo ano, foi lançado o livro intitulado “Nina: Uma Vida em Prosa e Poesia”, que reúne diversos contos e poemas da autora, uma realização da Seccional Balneário Piçarras. “Eu dizia que eu queria tanto escrever um livro sobre o que eu conheci. Eu escrevia os cadernos, a [minha filha] Cissa passava a limpo e ia para uma moça editar”, afirma. “Fiquei aprendendo só escrevendo em casa, lendo livro. Naquele tempo, a gente era menina e brincava muito cantando verso. Nunca me esqueci daqueles versos e ia escrevendo mais”.

Acervo: Assessoria de Comunicação Social

Na infância, Dona Nina morava no interior e até hoje permanece nessa região. No terreno do avô, João Rodrigues de Santana, existia um engenho de farinha. “Quando eu era mocinha, eu lavava a roupa para a minha mão no ribeirão, com o joelho na tábua. Quando o joelho cansava, ficava de cócoras. Naquele tempo não tinha Omo, não tinha Qboa, não sei como a roupa ficava clarinha”, relembra a senhora de cabelos brancos.

 

Quero falar do bairro Morretes

Onde nasci e fui criada

Junto com meus avós

Uma vida abençoada

Naquele tempo, lá atrás

A gente nunca sabia

Que o nome do bairro era Morretes

Pois o nome nem existia

(Trecho da poesia “Morretes” do livro “Nina: Uma Vida em Prosa e Poesia” | página 40-41)

 

A moradora idosa do bairro Morretes tem lembranças de visitar a Praia de Piçarras com seu avô aos 11 anos, quando o local não tinha árvores. “A praia era muito diferente, chegávamos às 10 horas para comprar peixe e se fazia uma fila de canoas, com os peixes pulando, era lindo de ver. Chegava em casa, fazia um caldo que tinha um sabor, porque o peixe era fresquinho”, se recorda com carinho.

Desde jovem, Dona Nina trabalhava na colheita de café e fumo. Aos 16 anos, se casou com outro morador criado no interior de Balneário Piçarras. A união com Mário Inácio de Borba – que também possuía um engenho de farinha, como o avô de Nina – foi firmada em julho de 1954 e, juntos, tiveram 10 filhos. Seu marido faleceu há 24 anos, com problemas do coração.

A senhora de 80 anos afirma que a vida na juventude não era fácil. Os mantimentos eram produzidos no próprio interior, provenientes das plantações de arroz, milho e feijão, além dos ovos das galinhas caipiras e a carne da criação de porcos. A família se deslocava pela cidade de carroça, em uma época onde não havia fornecimento de luz nem abastecimento de água encanada. “Era só lampião. Agora, se acaba a luz, a gente acende uma vela e acha que não clareia, mas naquele tempo a gente era acostumado”, exemplifica.

“Tudo era muito sacrificado, usávamos luz de querosene e lampião [...] O poço de água potável era um buraco largo no chão. As mulheres carregavam água nos potes de barro em cima do ombro, tampavam a boca do pote com folhas de samambaia para não derramar água nas costas”.

(Trecho de "Tempos Difíceis"do livro “Nina: Uma Vida em Prosa e Poesia” | página 27)

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Campanha pela luz elétrica

Acervo: Fundação Municipal de Cultura

Com o tempo, o interior foi se desenvolvendo e recebeu encanamento, fornecimento de energia, escolas, parte de calçamento e desenvolveu um comércio familiar. “Quando casei, isso aqui era tudo mato”, destaca a senhora, ao apontar para as terras vizinhas de sua casa, hoje povoadas. Dona Nina, que se define como uma pessoa “agarrada no interior”, não cogita se mudar para o Centro.

“Hoje temos um mundo muito diferente. Eu acho que evoluiu muito depressa. Cada dia que passa, vemos algo novo. Muitas coisas boas aconteceram... a vinda da energia elétrica, o banheiro dentro das casas com chuveiro e água quente para se tomar banho, televisão com imagem colorida, geladeira, as máquinas de lavar que agora até lavam e secam ao mesmo tempo, o telefone, agora os celulares, a internet que ajuda muito a todos”. 

(Trecho de "O Mundo de Hoje" do livro “Nina: Uma Vida em Prosa e Poesia” | página 54)

 

Você me mandou cantar

Pensando que eu não sabia

Eu sou igual a cigarra

Quando eu canto levo um dia

 

Todos os passarinhos cantam

Na entrada do verão

Tudo o que é velho se renova

Só a mocidade que não

(Versos do livro “Nina: Uma Vida em Prosa e Poesia” | página 46)

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